domingo, 16 de novembro de 2008

CONSELHO ESTADUAL DE EDUCAÇÃO DE SÃO PAULO

Deliberação da 2.269ª Sessão Plenária do CEE
Diário Oficial do Estado de São Paulo nº 206 – 31/10/2008 (sexta-feira) – P. Executivo - Seção 1 – Pág. 24


CONSELHO ESTADUAL DE EDUCAÇÃO

Deliberação da 2269ª, Sessão Plenária Extraordinária realizada em 29-10-2008

Manifestação Preliminar do Conselho Estadual de Educação do Estado de São Paulo Sobre proposta de Decreto, Apresentada Pela Capes de Criação de Um Sistema Nacional Público de Formação de Profissionais do Magistério.

Planos e projetos para o aperfeiçoamento da formação de professores são, inegavelmente, uma das questões mais prementes no atual cenário da educação brasileira.

Neste contexto, a CAPES apresentou para discussão a minuta de um Decreto, a ser editado pelo Presidente da República, a qual trata da criação, no âmbito do Ministério da Educação e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), de um “Sistema Nacional Público de Formação dos Profissionais do Magistério.”

O objetivo do projeto é o de organizar, em regime de colaboração entre União, Estados, Municípios e o Distrito Federal, a formação inicial e continuada dos profissionais do ensino.

Apesar da importância da questão e do interesse pela contribuição da união nesta área, os membros do Conselho Estadual de Educação, em reunião de 22 de outubro de 2008, manifestaram uma desaprovação unânime em relação a esta iniciativa. As razões principais da oposição do Conselho a esta medida prendem-se ao caráter inconstitucional da proposta, assim como o desrespeito a normas legais vigentes. De fato a minuta fere o princípio federativo. A competência da União, na área educacional é limitada pela competência dos Estados e Municípios na organização de seus próprios sistemas de ensino, que é reafirmada em toda a legislação posterior.

Constituição Federal “Art. 211 - “Art. 211 - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração

§ 1º a União organizará o sistema federal de ensino e o dos Territórios, financiará as instituições de ensino públicas federais e exercerá, em matéria educacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino mediante assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 14, de 1996)

De acordo com esta formulação, são os Estados e Municípios que definirão as formas de colaboração para a universalização do ensino obrigatório, tarefa esta que não pode dispensar uma política de formação de professores.
A Constituição, como a LDB, não prevê formalmente um Sistema Nacional na área da educação, nem o sistema federal de ensino se coloca acima dos sistemas estaduais e municipais. A integração no nível nacional se dá através da legislação e, principalmente, pela colaboração entre os três sistemas. A minuta do decreto dá peculiar interpretação ao termo “colaboração”, porque, pelo conteúdo do projeto, esta não se dará “entre” União, Estados e Municípios mas são Estados e Municípios convocados para colaborarem com a CAPES, a qual traça as diretrizes gerais da política de formação dos professores.

A inconstitucionalidade e ilegalidade do projeto no que diz respeito a interferências nas competências de Estados e Municípios fica muito clara na proposta de criação, nos Estados e no Distrito Federal, de “Fóruns Permanentes de apoio à Formação Docente”, a serem instituídos em cada Estado e no Distrito Federal, aos quais compete elaborar “Planos Estratégicos de Apoio à Formação Docente”. Cabe-lhe, também, o acompanhamento dos Planos, depois de devidamente homologados pela CAPES.

Não é de competência do Executivo Federal criar órgãos estaduais. Mesmo o Legislativo só pode fazê-lo respeitando o princípio federativo estabelecido pela Constituição Federal.

Neste caso, a extrapolação de competências é ainda mais grave porque interfere diretamente nas atribuições dos Governadores, das Secretarias e dos Conselhos Estaduais de Educação na formulação de suas políticas educacionais. Interfere, inclusive, no nível federal, com atribuições do Conselho Nacional de Educação.
O desrespeito à autonomia dos Estados e Municípios no que diz respeito aos seus sistemas de ensino, se manifesta também na composição desse Fórum, de caráter nitidamente corporativo e com interferência direta do Ministério da Educação.

De fato, compõem este Fórum, conforme é explicitado no § 1º do Art. 4º da minuta de decreto.

§ 1º o regime de colaboração será concretizado por meio da elaboração de planos estratégicos formulados por Fóruns Permanentes de Apoio à Formação Docente, a serem instituídos em cada Estado e no Distrito Federal, em que terão assento garantido:

I - o Secretário de Educação do Estado ou do Distrito Federal, que preferencialmente o presidirá;
II - um representante do Ministério da Educação, que secretariará o presidente do Fórum;
III - um representante dos secretários municipais de educação da respectiva seção regional da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação - UNDIME;
IV - o dirigente máximo de cada instituição pública de educação superior com sede no Estado ou no Distrito Federal;
V - um representante da seccional da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação - CNTE;
VI - um representante do Conselho Estadual de Educação;
VII - um representante da União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação - UNCME: e
VIII - um representante do Fórum das Licenciaturas das Instituições de Educação Superior Públicas, quando houver.
§ 2º o Fórum acompanhará a execução do plano estratégico e promoverá sua revisão periódica.


Além de participar da composição dos Fóruns e secretariá-lo, o Ministério da Educação ainda analisará globalmente os planos estratégicos apresentados e poderá atuar na sua execução, conforme reza o Art. 6º da proposta:

Art. 6º o Ministério da Educação analisará globalmente os planos estratégicos apresentados e poderá atuar na forma do art. 9º deste Decreto, considerando as etapas, modalidades, tipo de estabelecimento de ensino, bem como a distribuição regional e demográfica do contingente de profissionais do magistério a ser atendido.

Cabe, ainda a este “Sistema Nacional”, não só direcionar a formação inicial mas, inclusive a formação continuada, de acordo com o § 2º do Art. 8º da minuta do Decreto.

§ 2º a necessidade de formação continuada de professores será atendida por cursos homologados pelo Conselho Técnico-Científico da Educação Básica da Capes, a serem ofertados por instituições públicas de educação superior preferencialmente por instituições públicas de educação superior envolvidas no plano estratégico de que tratam os artigos 4º e 5º deste Decreto.
A necessidade de formação continuada de professores será atendida por cursos homologados pelo Conselho Técnico-científico da Educação Básica da CAPES. Note-se a necessidade de homologação pela CAPES, sem manifestação prévia dos órgãos competentes do Governo Estadual.

Em segundo lugar, parecer haver um caráter claramente ideológico nesta proposta. Isto se manifesta na utilização seletiva de itens da legislação que trata da formação dos professores, a qual será objeto de uma análise mais extensa por parte deste Conselho, e também na introdução de termos que não constam dos documentos legais. Assim, é difícil entender porque o preceito constitucional o qual afirma que a educação é “dever do Estado e da Família” se transforme em “compromisso público de Estado”. Assim também, é duvidosa a utilização de inclusão do termo “político” no item 2 do Art. 2º, que trata dos princípios do “Sistema Nacional de Formação dos Profissionais do Magistério”, o qual reza: “ a Formação do professor como compromisso com um projeto social, político e ético que contribua para a consolidação de uma nação soberana, presta, inclusiva”....... etc.

A menção a um projeto político parece desconhecer que os princípios que devem reger a educação nacional, como os de sua contribuição para a consolidação de uma nação soberana, justa, inclusiva e colaboração para o desenvolvimento no país podem ser atingidos através de diferentes projetos políticos, próprios de diferentes governos.

Também cabe reparo à utilização de um jargão que utiliza termos não adequadamente definidos como no item XII do Art. 2º o qual afirma que “a formação continuada entendida como exigência da atividade profissional, devendo integrar-se ao cotidiano da escola no contexto de uma pedagogia interativa e dialógica”, expressão esta que remete a uma pedagogia específica, não bem esclarecida, com exclusão de outras possíveis.

Há ainda inúmeros outros problemas, um dos quais é a restrição das ações de incentivo à formação docente exclusivamente às instituições públicas de ensino superior. Cabe lembrar que o setor privado forma a grande maioria dos docentes deste país e, inclusive, porque integra o sistema federal de ensino, não pode ser excluído de uma ação que tem por objetivo melhorar a formação inicial e continuada dos docentes do ensino básico.

Finalmente resta lamentar que a criação de um sub-sistema na CAPES, organizado em torno de um novo Conselho Técnico Científico da Educação Básica, o qual ficará responsável não só pela homologação da educação continuada mas sendo responsável também pela “regulação” dos mestrados e doutorados da área de educação, os quais serão retirados do Conselho Técnico e Científico da CAPES, o qual até hoje, era responsável pela regulação de todos os programas de pós-graduação, stricto-sensu e atuava em todas as ares de conhecimento.

§ 6º Os cursos de pós-graduação stricto sensu integram o Sistema Nacional Público de Formação dos Profissionais do Magistério e serão regulados pelo Conselho Técnico-Científico da Educação Superior da CAPES.

Cria-se assim, dentro do amplo sistema de pós-graduação, um enclave ou feudo para a área de formação de professores, quebrando a uniformidade do processo qualitativo e regulador. Com isto, rompe-se também com as tradições da CAPES, que foram responsáveis pelo extraordinário sucesso da Pós-graduação no Brasil. Nesta tradição, a CAPES não interfere e não normatiza a organização dos programas de pós-graduação, a não ser em termos de qualificação do corpo docente (titulações e produção científica) e infra-estrutura compatível com a atividade de pesquisa. A CAPES apenas os aprova através da indicação realizadas por e assessores ad-hoc indicados permitindo a ampla liberdade de iniciação.

Estes exemplos são suficientes, para mostrar que o conteúdo da minuta consiste numa afronta ao princípio federativo, à Constituição e à LDB. Se o decreto for editado atingirá apenas o sistema federal de ensino, não incidindo sobre os sistemas municipais e estaduais, contrariamente ao que se pretende.

OBS.: Esta manifestação foi aprovada por unanimidade pelo Conselho Estadual de Educação em Sessão Plenária Extraordinária realizada em 29/10/2008.

Arthur Fonseca Filho - Presidente
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